A obra Correspondência de Outono foi desenvolvida a convite dos curadores Hiuwai Chu e Raphael Fonseca para integrar a exposição Lúcido Devaneio — Panorama de Arte Contemporânea Portuguesa (2025), uma iniciativa da Galeria Municipal do Porto, sob direcção de João Laia, que visava fazer um mapeamento da diversidade presente nas práticas artísticas em território nacional.

​​

Este trabalho surge no seguimento do projecto Uma folha no bolso (2022), uma pintura mural concebida para o interior do Estabelecimento Prisional do Porto (Custóias). Matosinhos, e da mesma pergunta que já havia sido colocada com a edição de artista N.O.R.W.A.Y. (2023): como revisitar uma imagem que apenas existe num sítio inacessível?

​

Se em N.O.R.W.A.Y. a solução encontrada consistiu em reproduzir fragmentos da pintura em múltiplos selos, permitindo que o envio por serviço postal fizesse a imagem da trepadeira expandir-se para lá do território confinado em que existia, em Correspondência de Outono, equaciona-se outro problema: e se a imagem, assim que saísse desse espaço delimitado, entrasse num processo de degeneração, perdesse a sua cor, respondesse ao ciclo natural de decadência que afecta essas plantas? 

​

Recorrendo à manipulação digital alterou-se a cor de novos fragmentos fotográficos retirados da pintura mural, do verde original para cores mais outonais — vermelhos, laranjas e castanhos. Em seguida, produziram-se novos selos que, desta vez, ao invés de serem utilizados para enviar uma mensagem, foram colados no espaço da galeria, numa composição que remete a uma ruína, a um vestígio arquitectónico absorvido pela vegetação.

A instalação joga com uma ideia de circularidade, mantendo os mesmos temas de desejo e isolamento que haviam motivado os projectos anteriores. A sugestão de expansão da trepadeira materializada pelo desenho da colagem dos selos é contrariada pela lembrança constante do referente original de onde provém a imagem — em cada selo encontram-se inscritas as coordenadas geográficas da prisão e o desenho na parede, na verdade, replica um segmento da pintura original — como se todos os gestos de fuga fossem inúteis e absurdos. Apesar da grande escala da instalação e do exagerado número de selos, espécie de materialização de um enorme desejo de comunicar com alguém, permanece uma sensação de vazio, de ausência, que só sai reforçada com o destaque da palavra "Vacant", apropriada de um carimbo utilizado pelos serviços postais para identificar quando uma carta não pôde ser entregue porque o lugar endereçado não está ocupado.​​​